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Batendo em nazistas e explorando tumbas em Indiana Jones e o Grande Círculo — Análise

Foto do escritor: Lucas SouzaLucas Souza

Pintura de Adolf Hitler emoldurada em dourado com uma marca de tiro na testa do ditador.
Reprodução: Bethesda Softworks

Indiana Jones e o Grande Círculo é, ao mesmo tempo, uma das adaptações mais interessantes que já vi, mas também uma das mais “comportadas”. O que não chega a ser um problema, porém, em minha visão, limita sua grandiosidade.


INTERESSANTE PORQUE...


Assume ser um videogame em um nível quase que celebratório, no qual você se sente dentro de um jogo diferente a cada momento – mesmo sem nenhuma mudança drástica de jogabilidade. Suas diversas inspirações borbulham pela sua superfície, no entanto nunca transbordam ao ponto de ofuscar sua personalidade própria.


Quando anunciado, havia a dúvida sobre o que seria um jogo de Indiana Jones e, por razão da existência de Uncharted, não foi difícil que se solidificasse no imaginário uma espécie de padrão que o jogo poderia seguir. Contudo chegou-se o primeiro “choque”: Indiana Jones seria em primeira pessoa; colocando o lendário herói de ação atrás da câmera – pela maior parte do tempo, pelo menos.


Não é Wolfenstein, não é Dishonored, não é Hitman e, com certeza, não é Uncharted. No entanto, não deixa de carregar, de cada um desses jogos (e de muitos outros), elementos que são entrelaçados e bem dosados para compor um jogo de aventura único, que, por meio de seus mundos semiabertos, te colocam numa caixa de areia muito prazerosa de se explorar.


Esqueleto humano no chão, encostado numa pedra intermediado pela interface de foto do jogo.
Reprodução: Bethesda Softworks

Em sua nova aventura, Indiana Jones se junta a jornalista italiana Gina Lombardi para impedir que o Eixo, por meio do arqueólogo Emmerich Voss, descubra o segredo por trás do "Grande Círculo", o qual envolve diversas regiões do nosso planeta. Essa é prerrogativa utilizada para colocar o jogador para explorar diversas partes do mundo, incluindo as três áreas semiabertas: Cidade do Vaticano, Gizé e Sucotai


Nesses cenários, há missões secundárias mais encorpadas que se ligam diretamente a narrativa principal (e nada devem em termos de qualidade às principais) e uma quantidade enorme de missões menores que aproveitam bem os espaços do mapa. Além disso, cada um desses locais é cheio de segredos e quebra-cabeças que alcançam um bom equilíbrio entre o guiado e obtuso (e essas descobertas podem ser facilitadas pela aquisição de itens específicos durante o jogo).


Essas atividades envolvem tirar fotos de pessoas, lugares (e gatos!); encontrar artefatos perdidos, descobrir segredos dos inimigos, ajudar a população local; lutar em clubes da luta clandestinos e entre outras coisas. Em todo canto que você for, terá alguma coisinha para ser feita ou coletada. Tudo isso intercalado pelos momentos de combate e - muita - furtividade (seja espreitando ou utilizando disfarces) já que todo local está recheado de inimigos.


Jogador dentro de uma tumba em Gizé segurando um isqueiro.
Reprodução: Bethesda Softworks

Um momento de eureca que me marcou aconteceu em Gizé, o segundo mapa, o qual introduz um isqueiro que o protagonista usa principalmente para iluminar o caminho nas tumbas presentes no mapa. No entanto, em minhas andanças pelo deserto, reparei que a todo momento passava por um pôsteres de propaganda nazista. Foi, então, que tive a ideia: e se eu aproximar o isqueiro aceso desse pôster? E... funcionou! O pôster entrou em chamas e ganhei mais alguns pontinhos de descoberta.


Quando se fala do sistema de combate de Indiana Jones, tudo é carregado com um estilo espalhafatoso que muito adiciona a tateabilidade dos movimentos do Indy. Socar, chicotear, atirar e quebrar objetos nas cabeças dos inimigos, tudo isso é acompanhado por efeitos visuais e sonoros que intensificam a dramaticidade, assim transmitindo toda sensação de ter "super poderes" comum à representação de heróis de ação.

Vista geral do Vaticano a partir do Castelo Sant'Angelo.
Reprodução: Bethesda Softworks

Sua abordagem prioriza mais o conjunto de sentimentos que o jogo quer passar ao jogador do que um comprometimento com uma profundidade mecânica. Sendo assim, também, a sua maior vulnerabilidade às críticas, caso o jogador esteja buscando um nível considerável de desafio em qualquer uma de suas camadas.


É tudo extremamente satisfatório; principalmente a atividade mais recorrente durante o jogo: bater em fascistas e nazistas. Atividade que, apesar de tradicional nos títulos da franquia, ganha todo um novo significado diante dos acontecimentos políticos na história recente – e a Machine Games tem completa consciência disso.


Por razão de jogos eletrônicos e o cinema serem mídias com diversos pontos de contato, não seria estranho se os desenvolvedores buscassem uma adaptação que se aproveitasse inteiramente disso. Ainda assim, o que foi feito foi um trabalho que buscou provocar no jogador os mesmos sentimentos evocados pelos filmes, mas nos próprios termos da mídia do videogame.


Um ponto muito comentado é a (des)inteligência dos inimigos, frequentemente comparada à semelhante falta de habilidade dos capangas vistos nos filmes. Dessa forma, o que poderia ser visto como um problema, torna-se parte do charme. E tendo a concordar com essa percepção, essa característica gerou boa parte dos momentos de uso inventivo das armas à disposição do Indy – como o seguinte episódio que aconteceu comigo:


Enquanto estava espreitando os corredores externos do Castelo Sant’Angelo, percebi um inimigo sozinho, porém distante. Ao meu lado, havia uma estátua de pedra à qual eu poderia servir de arma. Peguei-a. Por razão de seu peso, fui obrigado a ir lentamente. Fui avistado, mas ele não percebeu o perigo até eu estar próximo o bastante para descer com a estátua na cabeça dele.


Parte externa do Castelo Sant'Angelo. Corredor estreito, iluminado por uma lâmpada e com um portão de ferro ao fundo.
Reprodução: Bethesda Softworks

COMPORTADO PORQUE...


Apesar de todos esses méritos enquanto jogo, sua existência ainda está condicionada por ser um produto – mais especificamente, um jogo de altíssimo orçamento que exige certas conformidades. “Comportado”, então, porque… bem, essa parte vai exigir um pouco mais de contexto antes.


Ao se discutir trabalhos adaptados, um ponto de partida normal é o da fidelidade: o quão próximo está este novo trabalho em relação ao seu material original? E, normalmente, a conversa segue e perdura por horas, como se existisse um acordo comum entre todos os participantes, não só sobre o que seria essa tal fidelidade, mas também a crença em sua necessidade. Porém, será que é tão simples assim?


Em filmes adaptados de livros, por exemplo, são habituais as reclamações sobre o nível de fidelidade quando se suprimem ou adicionam acontecimentos e personagens. O “ser fiel” é atrelado ao conteúdo – ou seja, ao que de fato acontece. Então, as diferenças formais entre as próprias mídias são abstraídas por ser óbvia a impossibilidade de uma fidelidade completa nesse nível.


Com isso em vista, o jogo parece continuamente estar pisando em ovos. Desde a inserção de uma nova história que ocorre no espaço deixado entre dois filmes (“Caçadores da Arca Perdida” e “A Última Cruzada”), onde pode existir timidamente sem ameaçar o cânone da franquia, até a recriação, cena a cena, da sequência inicial do primeiro filme.


Além disso, a abordagem de modernizar tanto o herói quanto a narrativa sempre fica pelo meio do caminho. Seja nas tentativas de dissipar a misoginia presente nos filmes clássicos da franquia ou ao tentar problematizar a legitimidade das “aventuras arqueológicas” de Indiana, o jogo esboça e logo abandona essas questões.


Indiana Jones e Gina Lombardi em roupas de neve observando artefato.
Reprodução: Bethesda Softworks

CONCLUINDO...


No fim, “Indiana Jones e o Grande Círculo” é um grande jogo, envolvente e completo, mas em uma aventura que é mais interessante quando vivida por suas mecânicas do que quando interrompida pela narrativa, que é uma abordagem moderna ao personagem, porém muito acanhada pela importância da propriedade intelectual à qual pertence para se tornar realmente interessante.


E, apesar das competentes set pieces lineares encontradas ao longo da jogatina, sua maior força está em seus cenários densos e bem construídos que aproveitam de uma forma inesperada sua verticalidade para fornecer ao jogador uma experiência de exploração única impossível de ser ignorada para os amantes do gênero.


Texto editado e revisado por Alexandre Avatics (@Avatics).



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