top of page

De Parakacuk a TROUBLEMAKER - Raise your gang! — Artigo | Crítica | Gamer Paciente

Com visível esmero e dedicação de indonésios apaixonados por animação japonesa, Troublemaker é uma mistura curiosa de referências e culturas | Reprodução: Gamecom Team
Com visível esmero e dedicação de indonésios apaixonados por animação japonesa, Troublemaker é uma mistura curiosa de referências e culturas | Reprodução: Gamecom Team

Softpower é um termo que vem da teoria das relações internacionais e se refere a uma forma de poder de uma nação que exerce sua influência não por coerção ou força militar, mas por sua cultura e economia. Como um país em desenvolvimento, sabemos como ninguém o que é consumir os valores culturais e estar à mercê da Economia estadunidense quando falamos de entretenimento tais quais nossos queridos…videogames.


Não é também estranho para nós enxergar como o Japão exerce seu softpower por meio desse meio, com jogos que consumimos desde a década de 80 do século passado, bem como animações e quadrinhos nipônicos que se tornaram fenômeno mundial.


E assim como nós brasileiros, outros países também são influenciados por essa cultura, pois crescem jogando e assistindo conteúdo criado em solo nipônico e assim moldam não só o repertório de mecânicas e temáticas, mas também detalhes mais técnicos como cinematografia, fotografia e acima de tudo: referências.


Equipe da Gamecom Team, formada por jovens talentos de uma geração que cresceu influenciada pelos animes
Equipe da Gamecom Team, formada por jovens talentos de uma geração que cresceu influenciada pelos animes

Criado em 2014, o time indonésio de jovens desenvolvedores começou no Ensino Médio e em 2020 se firmaram como um estúdio com a missão de levar para o mundo os produtos da indústria local indonésia. Após lançar dois jogos, A Day Without Me e Babol the Walking Box, a equipe inicia um novo projeto mais ambicioso: Troublemaker.


Troublemaker é um jogo da equipe anteriormente batizado de Parakacuk: Raise your gang. O promissor título independente apresenta a proposta de um jogo de porradaria em ambiente escolar, buscando inspirações em jogos como Yakuza, God Hand e Bully, adotando uma narrativa totalmente inspirada no estilo de RPGs e Visual Novels japonesas, mas mantendo toda a sua ambientação em uma cidade típica indonésia.


É até sobrepujante como essa salada de culturas e referências se mistura para criar uma experiência com toda certeza ímpar, ainda que recheada de limitações orçamentárias e até mesmo técnicas, por parte da equipe envolvida.


muito amor, porém muitos problemas técnicos

Troublemaker utiliza um motor gráfico com gameplay majoritariamente 3D, a Unreal 4, optando por modelos e texturas mais puxadas pro realismo, o que possui uma enorme inconsistência de qualidade. As texturas de baixa resolução com aspecto fosco aplicadas aos modelos 3D dão uma falsa e breve sensação de gráficos de alta qualidade, mas em movimento eles se comportam de maneira sobrenatural e borradas, além do aspecto de “lavadas”. 


Troublemaker (2023) | Reprodução: Gamecom Team
Troublemaker (2023) | Reprodução: Gamecom Team

Em alguns momentos a animação é muito bem feita e se comporta de maneira realista, mas em outros a colisão traz uma sensação de mal acabamento muito forte, com partes dos corpos atravessando outros objetos, o que não é exatamente um grande problema. Mas às vezes os controles também não respondem bem aos comandos, com um certo atraso para que as animações de ataque e contra-ataque sejam executadas, prejudicando o tempo de reação e afetando o gameplay.


Pra acrescentar ainda mais ao estranhamento, os diálogos são travados com modelos 3D realistas ao fundo e retratos 2D desenhados à mão na frente, mas com uma direção de arte completamente diferente, criando um contraste muito forte. Adotou-se não só para os diálogos mas também para as cutscenes a direção de arte típica de animes e mangás, com todos os traços característicos desse estilo. Essa decisão cria uma dissonância perene entre cutscenes e gameplay, já que a discrepância do realismo e do anime é muito forte, e no meu caso ela se manteve por quase toda a extensão do jogo.


Talvez tivesse sido melhor optar por uma direção 3D com uso de toon shading, mas é provável que por questões orçamentárias a equipe tenha optado pelo que tinha de mais prático à mão.


Troublemaker (2023) | Reprodução: Gamecom Team
Troublemaker (2023) | Reprodução: Gamecom Team

O design do jogo como um todo é bem linear e objetivo, o que pra mim é um ponto positivo, mas pode incomodar jogadores que detestam paredes invisíveis e preferem espaços mais abertos. A estrutura é bem pautada em ir do ponto A ao ponto B, iniciar uma cena e avançar a história. Entre as cenas e durante a locomoção há a possibilidade de acontecerem encontros com outras gangues de alunos. O jogador vai acumulando dinheiro que pode usar para comprar itens e melhorias de combate, como aumentos de atributos e novos golpes especiais.


Troublemaker capricha mesmo no seu roteiro. Puxando a temática de brigas de alunos adolescentes no colégio, a trama segue o personagem Budi, que vive com sua mãe e padrasto e costuma se envolver em confusão por não aceitar desaforo ou bullying de outras pessoas, partindo pra porrada. Este comportamento faz com que sua mãe tenha de buscá-lo em delegacias de polícia com certa frequência, fato que lhe traz imensa infelicidade e aborrecimento.


Enquanto desenvolve a trama principal, o roteiro apresenta os personagens coadjuvantes que formam o grupo de novos amigos de Budi, seus colegas de turma e seu interesse amoroso, algo que não é exatamente novidade nas histórias de animes e mangás com essa temática, mas que aqui adquire uma tonalidade diferente por envolver alguns elementos da cultura indonésia.


É válido destacar como o roteiro é conduzido com uma série de clichês e referências a obras japonesas, como Jojo’s Bizarre Adventure, por exemplo, detalhes que só quem consome esse tipo de conteúdo poderá perceber e desfrutar. Esse recurso infelizmente traz o perigo de alienar jogadores que não possuam as referências. Mas isso é uma escolha consciente artística, e valoriza de certa forma a obra.


Troublemaker (2023) | Reprodução: Gamecom Team
Troublemaker (2023) | Reprodução: Gamecom Team
Reprodução: Shueisha
Reprodução: Shueisha

Troublemaker é, apesar dos problemas, um título que inegavelmente transparece um aspecto artesanal e apaixonado. É nítido ver no jogo como os desenvolvedores tiveram o carinho de desenvolver um roteiro redondinho, mesmo com a qualidade das ilustrações inconsistente, com traços e arte-finalização amadoras, e um gameplay igualmente inconsistente, com falhas de registro de comandos e atraso nas animações. 


Ele é a prova de que não é preciso ser um profissional extremamente habilidoso pra construir um projeto completo, e o resultado final ganha muito mais corpo do que aparenta por uma análise fria e técnica quando você percebe essas nuances.


É um jogo com alma, que você sente que pessoas comuns e verdadeiras sentaram para idealizar, discutir, planejar e executar, sem se preocupar se estaria bom o suficiente para o mercado, mas fazendo o melhor que puderam, com dedicação e esmero. E produzindo, no melhor estilo, arte.


Redigido por Felipe Lins e editado por Maya Souza



Já pensou em fazer parte do no nosso grupo do Discord? Lá temos vários eventos, materiais de estudo e uma comunidade incrível esperando por você. É só clicar aqui!


Siga o Game Design Hub nas redes sociais!



bottom of page