Doujins, ditadura, morte e espiritualismo: Conheça Subversive Memories e Akira, desenvolvedor brasileiro que mora no Japão! — Entrevista
- Redação
- 15 de jul.
- 7 min de leitura

Na última semana, aconteceu a edição de 2025 do Festival Jogatório, evento gratuito que celebra o desenvolvimento de jogos independentes no Brasil, oferecendo, inclusive, ajuda de custos para aqueles pretendem expor as suas obras. Lá, tivemos a oportunidade de conhecer e conversar com Akira, um desenvolvedor brasileiro de jogos que, desde 2022, mora no Japão. Confira abaixo:
Max: Então, Akira, pra começar, você tá morando no Japão há quanto tempo mesmo?
Akira: Três anos e meio, eu acho. Não lembro as datas exatas, mas é isso.
Max: Você é o desenvolvedor que veio mais de longe aqui, tipo, a léguas de distância de todos os outros. Qual é a experiência de ter, basicamente, voltado pro Brasil, não sei exatamente a quanto tempo você tá fora, mas voltado pro Brasil pra mostrar o Subversive Memories?
Akira: É meio surreal, né, Max? Porque, primeiro que a viagem, sim, é muito longa, mas ao mesmo tempo… eu saí do Brasil meio que no meio da pandemia, ali no começo de 2022, quando ainda tinha algumas restrições. Eu fiquei de máscara um ano pra sair na rua, então voltar pra cá e ver as pessoas sem máscara, ver aglomeração, gente junta, depois de cinco anos sem ver isso, porque no Japão ainda não tem muito, é meio surreal.
E também é surreal voltar. Sair do Brasil como um cara que gosta de jogos e voltar como um cara que faz jogos. É uma coisa muito diferente, eu não imaginava que eu ia ter uma recepção tão positiva quanto eu estou tendo agora. Muita gente não acredita que eu estou fazendo… e eu também não acredito que é o meu primeiro jogo comercial.
Max: Eu acho isso interessante, mas tipo, como é essa experiência de se readaptar ao Brasil, mesmo que por algumas semanas? E isso me faz pensar em uma coisa. Você anunciou o Subversive Memories em eventos lá? E se sim, como é que foi?
Akira: O primeiro evento que eu levei o Subversive, na verdade, foi na minha cidade. Eu não lembro o nome, era tipo Pixel Festival, alguma coisa assim. Era um festival de jogos indie. Só que na verdade o conceito de indie no Japão é muito diferente, né? Eles têm os doujin, que são aqueles indie mesmo, que só vão em feiras. Eles não têm nem canal online. É muito comum, por exemplo, você ver mangá feito por fã de alguma história alternativa. Jogos tipo Touhou, por exemplo. Touhou é um doujin.
Você tem que comprar os jogos do desenvolvedor nas feiras e esse tipo de feira lá é muito grande, mas ao mesmo tempo parece que não tem um meio termo. Ou você compra um jogo Triple A da loja de videogame ou você compra um doujin do cara que só vende o DVD na feira de jogos. Não tem um meio termo como a Steam, assim é muito difícil ter desenvolvedores que são profissionais independentes. Então esse foi um choque também, mas é uma perspectiva nova.

Max: Então tem uma galera que só, tipo, o jogo deles é tão secreto assim que você só consegue jogar duas horinhas por ano. É isso?
Akira: Sim, sim. Então tem gente que produz jogos só pra esses eventos. Em geral eles não vivem disso, e essa é uma diferença também. É muito uma coisa de fã pra fã. Então, por exemplo, quando eu penso em indie japonês eu penso no Cave Story, mas ele não é uma boa demonstração. Demonstração de jogos indie são muito essa questão de pessoa para pessoa, né? Alguém que faz uma coisa muito caseira e nem comercializa. Às vezes ela até dá de graça nesses eventos, mas é uma coisa extremamente obscura, de nicho.
É uma coisa que você não vai encontrar em outras línguas que não sejam japonês. É uma coisa bem particular deles. Hoje eu vejo que os desenvolvedores brasileiros indies estão se profissionalizando muito rápido em comparação com os japoneses, por exemplo. Eu diria que uma feira desse nível aqui no Japão não existe. Ou existe uma Tokyo Game Show ou essa feira de doujin, que é tipo um… É tipo um Artist Alley de games. Tipo, esses jogos não estão disponíveis em nenhum lugar que não esteja nas mesas.
Max: Então tem um ecossistema muito específico que não se replica aqui do mesmo jeito que o mangá, né? Agora eu queria fazer perguntas sobre o Superversive Memories. Menos sobre quem é Akira e como é que funciona a distribuição e mais sobre o conteúdo do jogo. De onde surgiu a ideia do Subversive Memories? Por que você decidiu explorar as temáticas que você explora dentro do jogo, relacionada à repressão e a eventos históricos do Brasil que são muito debatíveis, e como você acha que o seu jogo se encaixa hoje na política brasileira, digamos assim, no atual cenário político brasileiro?
Akira: Acho que quase todo mundo aqui começa a criar os jogos por iterações né? Primeiro você tem uma ideia e você adiciona ou muda alguma coisa dela, e assim você vai seguindo até chegar no conceito final. Eu queria primeiro fazer um jogo de terror, um jogo survival horror e nem era um tema de militar, ditadura nem nada. Aí a segunda etapa foi ter a inspiração do Control, aquele jogo da Remedy, que tem as questões do FBC, que é um departamento imaginário, do governo, que encontra eventos paranormais. E eu queria que se passasse na América Latina primeiro, não especificamente no Brasil.
Depois de jogar Detention, que eu sei que você conhece, aí é que eu percebi que eu deveria partir para um lado mais específico, mais pessoal, mais detalhado e que isso faria o jogo mais interessante e não menos comercializável. E ali então essas foram as inspirações: uns survival horrors old school, depois com Control e automaticamente ali Alan Wake, e os jogos da Remedy, e depois Detention como uma expressão principal no termo de narrativa… que não é um jogo sobre o terror branco taiwanês é um jogo que se passa no terror branco taiwanês são coisas diferentes. Assim como tem vários filmes que estão saindo agora que falam tem a ditadura como setting, o lugar que se passa e o tempo mas não é o tema não é… O protagonista não é a ditadura e não são os personagens que fazem parte dela. Subversive Memories também funciona assim.

Max: Agora falando sobre o estilo de arte que você deseja empregar… é um jogo de terror bem convencional no sentido de que é um pouco da fórmula do primeiro Resident Evil. Sei lá, Signalis recentemente fez a mesma coisa. Como você acha que Subversive Memories se destaca não só pra gente do Brasil, mas ao exterior?
Akira: Em termos de história, acho que você pode fazer vários jogos que são uma releitura de Resident Evil em vários cenários. A própria Capcom fez isso. Não só ela fez Resident Evil, mas depois a gente teve o Dino Crisis, até a Onimusha mesmo. Então nesse ponto, Subversive Memories parecem muito com Resident Evil, só que no cenário brasileiro. Mas o que diferencia ele em termos de gameplay é a forma como você interage com a história. Porque muitos desses jogos eles necessitam de documentos que você ache ou interações específicas no cenário. Subversive exige um pouco mais do jogador porque no personagem principal existe um elemento de espiritualidade.
A personagem principal é uma médium e ela se comunica com as vítimas da ditadura, então você não encontra cartas no jogo que explicam aquelas histórias, até porque aquelas pessoas desapareceram no mundo real sem contar as histórias delas. Não seria plausível no jogo que ela encontrasse um documento falando da história do Rubens Paiva, por exemplo, e não que ele esteja no jogo. Mas nenhuma dessas pessoas teve a história escrita, elas simplesmente desapareceram. Então pra que isso se encaixasse dentro do contexto e pra que isso tivesse uma diferença de gameplay, a Renata, ou o jogador, precisa encontrar velas no jogo, que são itens consumíveis, e decidir onde eles vão utilizar essas velas que vão liberar partes diferentes da história. E isso é uma coisa muito diferente em relação aos jogos survival horror mais clássicos, eu acho.
Max: E agora, misturando tudo de certa forma, você agora tem uma distância cultural da história que você mesmo está contando, né? Por conta do fato de que você não está mais aqui. Como é observar o Brasil e essas histórias estando fora, vivendo outra realidade?
Akira: É triste [risada]. É triste porque a gente vê muitas coisas que se repetem, e isso fica muito evidente quando você não está presente. Porque é como se você estivesse vendo o que pra vocês acontece em tempo real, pra mim é como se você estivesse vendo uma história se escrevendo agora já. E eu acho que o Subversive Memories tenta trazer essa perspectiva de que existem ciclos que não deveriam se repetir. E eu acho que estando de fora, eu consigo ver isso de uma forma diferente.
Mas além disso, existe também outra questão que não é tão relacionada quanto ao viver fora, mas é muito relacionada ao viver… a pesquisar assuntos. Por exemplo, eu sou natural de Osasco, quer dizer, sou de São Paulo, mas cresci em Osasco e tem uma base militar em lá. Eu fui descobrir apenas ano passado que aquela foi a base militar que Carlos Lamarca, um dos militares que ajudou movimentos de resistência, na verdade foi uma das pessoas mais procuradas pela ditadura, ele roubou os fuzis da base militar que fica a literalmente 5 minutos da casa dos meus pais.
Isso não foi contado nos livros de história, eu não aprendi isso no ensino médio, eu não aprendi isso em lugar nenhum. Isso é uma pesquisa que eu tive que fazer por conta própria. Independente de estar no Brasil ou não, é uma coisa que eu sinto que vive numa realidade paralela, em que ninguém mais conhece e que a gente precisa escavar ela de volta à superfície.
Max: Entendi. Só pra finalizar agora, qual é o seu... o monstro de terror que você mais tem vontade de conhecer na vida real? De terror e de videogame em específico.
Akira: Conhecer, tipo, ficar amigo dele?
Max: Pô, conhecer, trocar uma ideia, jogar uma bola, ver o cara pessoalmente, assim, apertar a mão.
Akira: A verdade é que eu não jogo muitos jogos de terror, né? Mas… [risada] nesse caso aí, eu diria que algum. Provavelmente algum personagem de Resident Evil, pra entender o que aconteceu. Falar, “amigo, por que que você tem um olho no lugar do seu ombro? O que aconteceu com você, velho?” A gente senta num bar... Eu faço o quê? Eu troco uma ideia com ele, assim, desse jeito assim.
Subversive Memories pode ser colocado na sua lista de desejos da Steam clicando aqui.
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