Um grupo de amigos descobrem juntos um novo jogo em que eles podem atirar um nos outros sem consequências, repetidas vezes, de forma literal… Quem nunca pensou em fazer isso, não é mesmo? Pois essa é a premissa inicial de Friends vs Friends, desenvolvido pela Brainwash Gang, distribuído pela Raw Fury e lançado para Steam no último dia 30 de maio. Um jogo que mistura “trocação de tiro” em primeira pessoa online com construção de baralhos e criaturas antropomórficas fofinhas. É, eu sei, nenhuma dessas palavras está na Bíblia.
De primeira, a apresentação do jogo é promissora. Seus visuais são incríveis, bem coloridos e com intencionais texturas de baixa resolução para dar um charme “meio retrô”. Os ambientes variam, desde um teatro aparentemente abandonado, a carros em movimento numa autoestrada com um "climinha" de filme brega de ação, passando por telhados de prédios em ambientes urbanos e agitados.
Friends vs Friends me ganhou fácil com seus visuais, logo quando o vi de relance em algum dos eventos de jogos no ano passado. Depois da linda cutscene animada com uma música empolgante, somos jogados no hub principal que contém uma “base de operações” em formato de lanchonete na beira da estrada. É lá onde aprendemos o básico do básico e a como dar nossos primeiros passos.
Embora a interface inicialmente possa parecer confusa, é fácil aprender o que fazer e quais caminhos seguir em Friends vs Friends. Você pode explorar esse hub inicial para se acostumar com tudo, como por exemplo, aprender o que cada arma faz no clube de tiro, brincar na máquina de gacha (que desbloqueia cosméticos), montar e testar novas combinações de cartas, ir até a lojinha comprar booster packs (com dinheiro de mentirinha, pois vale lembrar que o jogo não possui microtransações) para melhorar seu baralho de combate e testar suas habilidades com bots antes de ir para o prato principal: o modo jogador x jogador.
Para efeitos de comparação, ao iniciar uma partida online já me senti no modo Wingman de CS:GO, em que você e um amigo duelam contra outra dupla até restar apenas um lado. Mas aqui as coisas rolam numa “melhor de cinco”, com partidas bem mais rápidas, decididas em quem pontuar três rodadas primeiro, e suas utilitárias (como granadas e molotovs) substituídas pelas cartas do baralho que você pode modificar antes de cada combate. Apesar do foco ser o modo multijogador, você também pode criar partidas privadas com mais três amigos se preferir, porém lembre-se: um lobby privado não irá contar para as missões diárias, apenas para a experiência obtida, essa que aumenta seu nível de conta.
Os combates aqui são viscerais, rolando geralmente em curto/médio alcance com a maioria dos mapas sendo pequenos e bem projetados, cheios de brechas a serem dominadas. Com uma gunplay precisa, você deve saber a hora certa de usar suas cartas na manga (desculpa), explorar bem o design de cada fase para ganhar vantagem tática e administrar bem seus recursos para não chegar nas rodadas decisivas sem uma boa mão. É interessante que, assim como em um jogo de cartas tradicional, você pode ceder certa rodada, gastando menos cartas fortes e economizando para momentos decisivos.
Pensar desta maneira é crucial, não dependendo apenas de uma boa mira para conquistar a vitória, e por isso não é nada recomendado sair usando suas habilidades sem escrúpulo algum. Focar em aprender a combinar as melhores cartas com a sua dupla, se comunicar de forma clara, causar uma boa quantidade de dano com suas utilitárias, encurralar adversários e prever jogadas é, de fato, essencial. Esse é um ponto que considero positivo e que faz parte intrínseca da curva de aprendizagem, dando um tempero a mais para a fórmula do jogo.
“E como conseguir novas armas e cartinhas?”, você me pergunta. Pois é, conforme você aumenta de nível entre as partidas, também irá ganhar novos pacotinhos de cartas – e cá entre nós, a sensação de abrir um pacotinho de Magic ou Pokémon é boa demais, mesmo que de forma virtual – para assim liberar novas habilidades e armas que poderão ser usadas durante os embates, sendo essa uma das poucas reais sensações de progressão durante o jogo, infelizmente.
Durante os combates, você sempre começará com uma pistola simples junto de algumas habilidades, e só poderá sacar mais cartas no início das próximas rodadas. O arsenal aqui é bem satisfatório, passando por submetralhadoras, rifles de assalto, lançadores de granada e até por uma katana! O leque de habilidades também é extremamente sortido e vai desde as mais básicas como granadas incendiárias, bombas de fumaça e kits médicos, até as mais “parrudas” como torretas automáticas, congelamento, o bizarro poder de aumentar a cabeça dos seus adversários para facilitar acertos críticos ou aplicar lentidão e dano contínuo no time rival.
Apesar da violência e do gore, como por exemplo testemunhar o corpo do seu antagonista deteriorando de acordo com o dano recebido, somos recompensados na mesma proporção com um humor bobo e divertido decorrente da temática engraçadinha. E sim, eu considero isso um elogio.
Embora possua um loop viciante e jogabilidade gratificante, Friends vs Friends atualmente se concentra de forma exclusiva nesses aspectos, o que pode ser suficiente para algumas pessoas. No entanto, isso me preocupa, pois até quando o jogo conseguirá se manter dessa forma?
Até o momento existe um cronograma de atualizações futuras, dentre elas conteúdos gratuitos e outras expansões pagas que prometem novos mapas e personagens, mas é preciso lembrar que um jogo com foco no multiplayer deve gerir bem sua base de jogadores (que, spoiler: não é grande) ou vai acabar se limitando apenas em partidas privadas.
Insisto neste ponto pois o gerenciador de partidas parece básico e simples, separando jogadores apenas por nível da conta e não por habilidade individual, o que por vezes acaba soando injusto. As controvérsias em torno do matchmaking em jogos multiplayer, no geral, já são amplamente conhecidas e não pretendo me aprofundar nesse assunto, mas é importante lembrar que até mesmo as principais empresas do setor, como Valve, Riot, Blizzard e Ubisoft, enfrentam desafios significativos relacionados a esse tema há muito tempo. Sendo assim, o que esperar a longo prazo dos pareamentos online em Friends vs Friends? Infelizmente, para mim, só há um futuro certo para o jogo: filas vazias e salas fechadas com amigos… versus amigos.
Mesmo contando com visuais incríveis, mecânicas acertadas e design de fases competente, é meio triste pensar que um modo história faz falta aqui. Não me leve a mal, sou apaixonado por jogos multiplayer! Cresci com Quake e CS, mas acredito que uma campanha solo ou mesmo cooperativa viria a calhar para atrair novos jogadores com o passar do tempo e assim possibilitar a adesão de novos interessados ao modo principal. Isso até mesmo poderia dar uma sobrevida às vendas, tendo como motivador inicial uma campanha divertida, mesmo que eventualmente o multiplayer acabe em algum momento. Aproveitar esse clima urbano lindo que o jogo oferece, expandindo suas fases, implementando novas mecânicas ou talvez até mesmo aderindo a essa nova vertente de shooters independentes (os famigerados boomer shooters), seria de fato interessante para não “desperdiçar” o tanto de amor investido neste projeto.
SÍNTESE
Por fim, eu não gostaria que esse jogo fosse esquecido em 2023. É por isso que, apesar dos problemas recorrentes com o matchmaking, recomendo sim que você junte seus amigos para se odiarem em Friends vs Friends, que mesmo fora de promoção, apresenta um valor compatível com a sua proposta.
Agradecemos gentilmente a Raw Fury pela disponibilização da chave para análise!
Friends vs Friends está disponível para Steam e você pode conferir a página do jogo clicando aqui.
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Este texto foi editado e revisado por Gabriel Morais de Oliveira.
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